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1ª. RESIDÊNCIA   23-30/6

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  • recolha e tratamento de dados;

  • tertúlias entre o grupo criativo e individualidades, representantes de entidades públicas e da sociedade civil Mondinense;

  • mostra permanente dos resultados das dinâmicas criativas, de questionamento da realidade em análise, na sede de trabalho;

  • formalização de propostas de projecto;

  • mostra final das propostas de projecto;

         PROGRAMAÇÃO BASE  

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          SINOPSE  

Vários estudantes da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, de diversos cursos e ciclos de estudo, deslocados na Vila de Mondim de Basto, acompanhados por dois docentes, vivem, questionam, analisam, recolhem, refletem informação sobre o território, pessoas, paisagem e cultura do conselho, partilhando-a com a comunidade que os acolhe. 

Pretender-se-ia com esta residência colectiva que, cada participante inserisse toda a informação multissensorial que recolheria, individualmente e/ou em grupo, no seu particular processo criativo, mas com abertura a partilhas colectivas. 

Procurar-se-ia fomentar do modo mais natural, pelo encontro de interesses comuns e características para o bom dialogo e respeito mútuo, compor grupos de trabalho, parcerias, contaminações entre propostas. 

Esta acção foi desenhada com o objectivo de permitir aos intervenientes, decisores da coisa pública, neste caso, criativos proponentes de representações artísticas para o espaço público, ambiente de dialogo e partilha com a comunidade autóctone mas, essencialmente, entre os membros do grupo de participantes, para que passassem a formar um colectivo de identidade própria, dependente da experiência adquirida em grupo no terreno. 

Pretender-se-ia com este processo ultrapassar, nas propostas a conceber, o mero exercício mental de afirmações individuais, para se poder criar projetos de ampla difusão, potenciando as diversas qualidades existentes localmente, conjugando tudo numa rede de diálogos, consensos e trabalho em equipa, que prepare futuros. 

Essencialmente, promover propostas de projetos que partissem de um exercício de coração, porque impregnado de vivências positivas, porque, antes de mais, partilhadas.

Neste modelo de residência ficaria garantido um único resultado: a presença de um conjunto de pessoas de referências heterogéneas, reunidas no local para onde vão trabalhar, em processo de se tornarem um colectivo, em prol dos resultados do seu trabalho serem mais amplos em comunicação. Massa critica aberta à comunicação com os locais e em acto de criação exposto. Massa critica à procura de encontrar a expressão do granito amarelo, no contacto com o quotidiano local do conselho de Mondim de Basto.

          DIÁRIO DE BORDO  

Dia 24 de junho. Segunda-feira. Primeiro dia em Mondim de Basto. Há quanto tempo estamos em Mondim? Foi a questão que se impôs ao final da tarde. Para trás ficou um dia de visitas às pedreiras e de visitas ao nosso espaço de trabalho. A Vice-Presidente da CMMB - Professora Teresa Rabiço, o Arquiteto Paisagista Manuel de Carvalho e Sousa, o Engenheiro de Ciências Agrárias, Alfredo Pinto Coelho, o Arquiteto Fernando Nobre, a Bióloga e Geóloga, Mariana Faria, a Designer Olívia Gonçalves, todos engajados pelo Vereador Paulo Mota, para nos cederem informações preciosas para os nossos processos de criação. E tantas imagens se fizeram, nas cabeças dos participantes deste 1º. Simpósio de Granito de Mondim de Basto, nestas poucas horas. Ainda encontramos o Maurício, o António e um dos irmãos Mota. Vimos o Castro Crastoeiro e uma pedreneira toda marcada de modo “rupestre”, que suscita interpretações de mapa, ou ligações ao culto solar, avaliando pelas representações dos grafismos circulares. Infelizmente, Campelo já estava guilhado para ser explorado. Foi, no mínimo, um dia intenso. 

Os participantes ficaram organizados, pelos coordenadores, em quatro grupos temáticos de recolha de informação: Desenho; Fotografia; Vídeo; Som. Os grupos foram formados contornando alguma estabilidade de relações pré estabelecidas entre os participantes. No Desenho: Rita Castro Rodrigues (3º ano Artes Plásticas – Escultura); Miguel Teodoro e Rodrigo Machado, (recém formados em Artes Plásticas – Escultura); na Fotografia: Cláudia Campos (4º ano Artes Plásticas – Pintura), Rui Valina Mota (recém formado em Artes Plásticas – Escultura); no Vídeo: Gustavo Romeiro (Mestrando de Arte e Design para o Espaço Público); Álvaro Oliveira (recém formado em Artes Plásticas – Escultura); no som: Inês Peres Mesquita (4º ano Artes Plásticas – Multimédia); Maria Guimarães (recém formada em Artes Plásticas – Escultura).

 

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Ficou definido, também, que antes de mais, o grupo de trabalho ir-se-ia concentrar em todas as informações que englobassem o Granito de Mondim de Basto e a cultura que este origina, ou vice versa. Depois, nos factores turísticos que o conselho oferta em abundância. Pensamos ser importantíssimo, também, obter informações sobre as tradições e lendas da região, passando a um plano de maior compreensão da cultura autóctone, na sua generalidade.


Por outro lado, foi muito importante informar, e afirmar ao gupo de trabalho que, os resultados ambicionados para este Simpósio não são de categoria determinada, podendo ser individuais ou colectivos, não devendo existir stress, entre os participantes, na urgência de forçar qualquer das situações. 

Questões importantes a serem colocadas e vincar a todos os nossos anfitriões: Quais as ambições para os resultados deste Simpósio? Quais os “locais” de maior relevo para intervenção? Que enquadramento de intervenção ambicionam? Que informação nos podem fornecer dessas realidades? 


O Vereador Paulo Mota tem certeza que será benéfica uma reflexão mais erudita da realidade incómoda que a extração de pedra comporta no conselho. Gostava de a ver explorada, mais pelas possibilidades de evolução, transformação e comunicação contemporâneas, que esta indústria encerra em si, e menos, pela tradicional extração de pedra per si, mesmo que evoluída.
 

O Arquiteto, Fernando Nobre, já se encontra há 33 anos em Mondim. Quanto às pedreiras do Granito amarelo de Mondim incomodam pelo impacto ambiental. Existem no sopé do monte da Graça como feridas abertas. Contudo, pertencem à sustentabilidade económica da região, como a agricultura e o gado autóctone. Informa-nos que esta pedra é amarela porque oxidou ao vir à superfície. Explorada em profundidade, já será azul. Por isso, as extrações alongam-se à superfície. Não produzem grandes fossos, mas as pedreiras alastram-se como uma doença de pele no território. Ao contrário do granito azul, este de superfície é suave, ao sol brilha, quase dourado. As lendas desta região são outro filão. Que até existe bem explorado no site ligado à CMMB. Mas também, deveríamos contactar com Luísa Oliveira responsável pelo posto de Turismo. Aconselha-nos a ver a carta arqueológica. É um documento com uma beleza especial, em si mesma.
 

A Bióloga, Geóloga, Mariana Faria, do Serviço Municipal de Proteção Civil, classifica o granito amarelo de Mondim como bastante poroso. É uma pedra pouco compacta. É um granito alterado, “quase alterado para pedra metamórfica”. A invasão pelos líquenes não fará mal à pedra. Cria uma espécie de proteção que, tirando a cor, as pessoas limpam e voltam a expor a pedra à erosão direta. Existe para as pedreiras do território de Mondim de Basto potencial de recuperação, exatamente porque não são exploradas em profundidade. Como exemplo contrário, Vila Pouca de Aguiar e Braga, tem fragas enormes, irrecuperáveis, num sentido de rearborização. A CMMB terá feito o licenciamento de 8 pedreiras. Com esse licenciamento existe o pagamento de cauções, cujo dinheiro poderá ser empregue na recuperação da zona de intervenção. Contudo, estas explorações não cumprindo extrações de modo organizado, mesmo que apoiadas por estudos técnicos, dificultam muito esta tarefa. Por outro lado, recuperações destes espaços que não no sentido arbóreo, de recuperação de mancha verde, com projetos de outro tipo de aproveitamentos, não são aprovados. São tidos como fugas à responsabilidade, ou aproveitamento. Aconselhou a visita a Campelo e, se pudermos, assistir à vinda dos Romeiros. É uma festa com carácter quase antropológico, que mimetiza o passado, com romaria ao monte Farinha. Caracterizou-a como próximo de um São João, do Porto. Como curiosidade, foi referido que gente do mar vem aqui nesta peregrinação. Da zona da Afurada, por exemplo. Por isso, existem ex-votos de embarcações e outras referencias à faina. As celebrações ligadas à Senhora da Graça tem associação aos pescadores, existindo em várias áreas do território português, em Sagres e outras localizações próximas do mar. 

 

O arquitecto paisagista Manuel Sousa, juntando-se à tertúlia, contou a história da borboleta azul que se relaciona com formigas e plantas. Numa defecação de um animal que não se definiu concretamente, a borboleta nidifica. Isto acontece nos lameiros superiores do Alvão, fenómeno que só tem paralelo nos Países Baixos. A formiga contribui para o período de vida da borboleta. Referiu também, as Marmitas de Gigante, no leito do rio Cabrão, já em granito de vila real. E pensa ser indispensável a visita à Igreja de Atei.

 

O Engenheiro, de Ciências Agrárias, Alfredo Pinto Coelho, responsável sobre as áreas verdes, património e iniciativas culturais, caracteriza o território de Mondim como rural, com duas zonas distintas. Ribeirinha, no vale do Tâmega, que o liga ao Minho e, território de montanha, que os liga a Trás-os-Montes. Esta parte perfaz dois terços do território, onde se estabelece um terço da população. O perímetro florestal de Mondim de Basto já foi importante. Oitenta por cento hoje é baldio, mono cultural de pinheiro. Eucalipto sim, mas não interessa focar. A partir dos rios Olo, Cabril, Cabrão existe uma área florestal rupícola, espécies adaptadas às linhas de água. A área de baldio está sujeita a formas de organização comunitárias, lei que ainda perdura do PREC, pós 25 de Abril. A Vila vive do sector primário e terciário, não existindo serviços. O gado autóctone é um recurso importante da região. A Maronesa, nome que deriva do Marão, tem solar no Alvão. Deveria chamar -se Alvanesa, mas quem a nomeou pensava estar no Marão, pois os territórios encostam-se um ao outro. 

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A Vice-Presidente da CMMB - Professora Teresa Rabiço, vereadora da cultura e educação. Professora aposentada, de 1 ciclo, referiu que Travassos, Pardelhas, tem produção de mel.

As colmeias nesta região eram protegidas por construções circulares em pedra, com pequenas entradas. Intitulam-se Silhas, que deriva do Espanhol cadeira, referenciando os palanques em que as colmeias são colocadas no interior desses muros apiários. Hoje em dia estão desativados, pois seriam proteção para os ursos que atacavam as colmeias. Contudo, há pouco tempo, um urso espanhol, percorreu centenas de km e veio cá comer o mel de urze. Mondim apresenta abelhas e uvas na bandeira. Mel e Vinho. A freguesia de Atei tem muitos Solares.

A própria Câmara foi um solar abrasileirado. A zona ribeirinha era zona rica. O território na sua generalidade tem baixa densidade, com população envelhecida, sem acesso a transportes públicos. Não tem uma única camioneta pública para a sede de Conselho: Vila Real.

As pedreiras são salvação económica. Outrora, porém, as senhoras teciam redes de pesca ao rio, mantas de trapos que serviam de agasalho na cama. Fabricadas com 90 cm, a medida dos teares, eram cozidas na longitudinal, ou, serviam de capa de proteção à chuva, com capuz. Produzidas por uma peça única, cozida numa ponta. Para este fim, também se fabricavam capas de junco, que se intitulavam croças. Quanto ao Linho hoje ainda existem pessoas que mantem a tradição, mas apenas tecendo-o. Já não se semeia e não se trabalha o Linho, desde a lavoura ao produto tecido. 


Durante a tarde encontramo-nos com o Sr. Marcelino, presidente da junta de Atei, nas instalações da empresa Irmãos Mota da Silva, lda. Aí vimos fracturar um grande bloco de granito ao meio, por arrebentamento, que depois, ao ser movimentado pela máquina, para voltar a ser trabalhado, voltou a fracturar por causa dos “lisos” que são linhas de fractura naturais da pedra.

 

Dia 25 de Junho. Terça-feira. Segundo dia em Mondim de Basto. Visita pelo conselho de Mondim para contraponto ao granito amarelo. Ver xisto, lousa, mármore preto e um conjunto de outras referências que ultrapassam a realidade Mondinense criada pelo granito. Fomos ver as Fisgas de Ermelo, a aldeia e o pelourinho com oitocentos e tantos anos de existência. Uma evidência da importância desta enorme aldeia que foi sede de Conselho. No rio Cabril, junto à ponte romana, aconselharam-nos a tomar banhos. Contudo, as piscinas naturais aqui chamam-se  Piocas. Existem as de cima e as de baixo, nas fisgas de Ermelo. Fomos a Travassos  verificar um pormenor riquíssimo na construção em granito. Para além da pedra bem trincada, com junta seca, mas sem estereotomia regular, as padieiras das portas são encimadas por outra peça que se afasta por nesga de dois ou três centímetros, pousando apenas na zona das ombreiras. Algumas destas peças, não sendo inteiras, tem na ligação de duas pedras compridas, uma de fecho, como as dos arcos. Avistamos uma que não estava centrada com o eixo da porta, sendo as pedras laterais, uma mais comprida do que a outra. 

 

Após almoço, no restaurante Chasselik, que nos recebe em todas as refeições, começaram a surgir as primeiras sínteses de pensamento por parte do grupo de trabalho. Folhas de papel craft na parede, começaram a ser invadidas com desenhos e frases. 

 

Ao final da tarde recebemos no nosso espaço de trabalho, nas instalações da CMMB, o Sr. Luis, a mulher Luísa e a Carolina. A Luísa Oliveira é a responsável do posto de Turismo. O Luís, Escritor, Poeta, Luís Jales de Oliveira, disse-nos de antemão que não sendo um especialista, é um apaixonado por tudo que se relaciona com Mondim, a sua História e lendas. Reafirmou a ideia de Mondim ser um Conselho de transição, com uma grande influência minhota na zona do Tâmega. Um território com ocupação desde o inicio dos tempos, nos castros das terras altas, sendo que, no período da romanização, as populações foram atiradas para as Veigas. As Veigas serão terrenos irrigados, com plantações de cereais. D. Sancho I atribuiu foral a Ermelo, em 1196. Pelos anos mil e quatrocentos, recebe foral a Vila de Mondim de Basto, definindo / referindo as portagens da Ponte do Tâmega. Esta fazia parte da ligação com o litoral. Os produtos da região teriam sido, para além da pedra de granito, o ferro, a carne, os curtumes, entre outros. Os dois primeiros tiveram muita importância ao ponto de serem célebres, quer os pedreiros, canteiros, quer os ferreiros da região. Nomeações como Escourido, trás para a toponímia da Vila a relação com as escórias do metal. Pelos anos de 1500, a região atinge estatuto económico que, pelos anos de 1700/1800, recebendo incremento de dinheiros do Brasil, aumenta a sua importância na região Norte de Portugal. São Cristóvão e São Tiago, são os santos da devoção do Povo desta região. São Veríssimo teria outeiro que passou a ser Srª. da Graça. Esta será assim a expressão contemporânea de cultos ancestrais que sempre se praticaram no alto deste monte, correspondendo a um lugar primordial. Os acidentes geográficos como as Fisgas de Ermelo e o Monte Farinha, enquanto formações geológicas, terão cerca de 400 milhões de anos.

A toponímia deste monte poderá corresponder à evolução de Phary, Pharina, rainha dos povos Semitas e Fenícios. Esta rainha, enquanto divindade seria representada por um cone, nos tempos primordiais, depois animal - Vaca e, só mais tarde, por corpo de mulher. O monte Phary (nha) seria em si, a representação divina, pela sua fisionomia tão próxima de um cone perfeito. Contudo, no atual culto, a primeira data ligada à construção de um “santuário”, será 1745. Hoje o que lá existe será a quarta construção. As anteriores foram desaparecendo pelas intempéries a que o local está exposto. O santuário seria guardado por Ermitões, que viviam em grutas. Conta a lenda que o primeiro Ermitão vivia com uma imagem da Senhora, que desaparecia da gruta e era avistada no topo da montanha. Ele foi compreendendo que a imagem queria ir para cima. Outra lenda reza que, a imagem desapareceu e, quando reapareceu estava corada, cheia de camarinhas no manto. Teria estado do litoral, salvando uns embarcados que passaram a fazer peregrinação de agradecimento, tendo oferecido na primeira, uma redoma e uma réplica da sua embarcação. Por isso, nos cantares tradicionais existem frases como: “A Senhora tem redoma de vidro, que lhe deu um marinheiro, que andava no mar perdido”. Já a toponímia de Basto, conta a lenda que deriva de Bastulus, homem corpulento, que faz frente a um exército invasor e, na ponte, em defesa de eles não a travessarem, dirá: “Até aqui “basto” eu!” E bastou três vezes: Celorico, Mondim e Cabeceiras. Numa vertente do monte farinha existe um pedra alta a qual ainda hoje se apresenta caiada. Ação típica de um culto pagão. É referida como Menir, sendo que, a tradução mais direta de Menires será: pedras altas. Os Menires são “antenas” e têm uma ligação ao masculino. Só um Druída poderia colocar estas antenas em funcionamento. As Antas, por contraposto, serão elementos de ligação ao feminino, ligados á ideia de receptores. A pedra alta estará no eixo de todas as linhas de água de Mondim de Basto. 

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Este casal, rematou a sua imensa capacidade de contar a história e as lendas deste território afirmando que a Sr. Da Graça e rio Tâmega são os elementos centrais de identidade de Mondim de Basto. E afirmam existir uma saudade Mondinense que, não sendo fácil comprovar como patologia local, sentem não lhes ser possível atravessar a ponte e virar costas a esta paisagem, de ânimo leve. O casal referiu que, voltando ele da guerra do ultramar, já não conseguiram voltar a sair daqui, não conseguiram encarar qualquer outro afastamento à sua terra. Concluímos que, tudo o que nos relatou ilustra um território rico que não tem espelho perfeito na realidade de hoje. Com aquilo que relatou e que já não assistiu, ou que assistiu nas suas últimas expressões, então, perdeu-se imensa riqueza cultural em muito pouco tempo. Poderemos pensar no Granito amarelo como uma síntese imperfeita de toda uma mais complexa riqueza. — Lá vai mais ouro do nosso! Um dos muitos dizeres críticos, pelos Mondinenses, à passagem dos camiões com pedra pelas ruas da Vila. Longe irão os tempos de outros cantares à pedra, para esta se mexer. O Cantador ganhava mais do que os outros e a pedra perdia peso pelo seu cantar.

Dia 26 de Junho. Quarta–feira. Terceiro dia em Mondim de Basto. Durante a manhã saímos com o Luís em visita ao centro histórico da Vila de Mondim de Basto, ao seu casco antigo. Vimos as evidencias dos judeus ou cristão novos, com as cruzes lavradas nas ombreiras das portas, mas também os cunhais de pedra onde afinal dependurariam o Menorá, o candelabro dos sete braços, que exibiam nas suas datas festivas. A presença do povo judeu e sua cultura, também está marcada no território da Vila, na organização das próprias construções, que tendem a criar uma espécie de bairro onde as casas se agregam mais umas às outras. Apesar destas evidências, sabe-se pouco da sua história, porque viviam num certo secretismo, numa existência de resistência sobre a sua cultura e religião. O Luís referiu que existe na Holanda uma cidade nomeada de Ermelo, na Província Guéldria, com a toponímia igual à da aldeia de Mondim.

Ele cogita que os que daqui terão fugido, lá se instalaram.

Esta comunidade de judeus, Cristão Novos, tem muita importância no território e na sua primeira época de prosperidade, em 1500.

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Ao Jantar, no restaurante Chasselik, estivemos com o Paulo Mota e o Sr. Pereira, presidente da junta de freguesia da União de Freguesias de Campanhó e Paradança. Foi quem construiu o forno de cal que visitamos. Foi aventura que realizou com os irmãos e um cunhado, depois de voltarem de Angola, onde viveu dos 14 aos 28 anos. Produziam cal para a agricultura. Queimada de modo artesanal, descontinuaram a produção visto não ser rentável. O forno depois de aceso estava a carburar por 72 horas ininterruptas, chegando-lhe lenha miúda de giestas e não cavacos grandes. Dentro da estrutura que vimos era colocada a pedra calcária a fazer uma cúpula e, no cimo, colocavam pedra miúda, finalizando com brita. Isto evitava que as labaredas se perdessem por cima e, se concentrassem no cozimento da pedra. Esta era retirada do filão que visitámos como mármore negra, que terá sido levada para uma obra de revestimento do Hotel Ritz, em Lisboa. Uma das coisa que marcou na conversa com o Sr. Pereira, após ser questionado sobre que ambição teria para a nossa presença no território respondeu que, alguma coisa do que nós produzíssemos deveria ser levado para a freguesia dele. Sim, gostaria de ver uma grande peça na Vila, mas pensa que deveriam aparecer coisas, também, nas freguesias.

Dia 27 de Junho. Quinta–feira. Quarto dia em Mondim de Basto. O grupo de trabalho discute e desenvolve de modo empenhado, quase obsessivo, várias ideias centrais para os seus projetos. Quer ao almoço, quer ao jantar, ainda tem espaço para receberem mais convidados que lhes permitem explorar ou confirmar visões da realidade Mondinense, principalmente, aqueles que estiveram ligados ao trabalho tradicional da pedra. O “cantar à pedra” foi informação que os emocionou enquanto colectivo e exploram-na, no seu enquadramento com Sr.s Lúcio e António Martins, que esteve acompanhado pelo Presidente da Junta de Freguesia de Mondim de Basto, Carlos Martins. Ambos aposentados, ex-pedreiros, distinguiam-se nos seus afazeres, por um ser mais de as lavrar, conformar, e o outro de as assentar. O Sr. António Martins disse: — O assentamento é Paixão! Referia-se com muito orgulho à possibilidade de construção de muros e ao aprumo da sua execução. — Colocava os Cunhais, punha o fio e era só!. Para mais, elucidou que a pedra tem correres, que nomeou de levante, prumo e troço. O primeiro é horizontal. O segundo deve ser ao Norte e, o terceiro perdemos a sua explicação, no meio de tantos outros relatos, de quem se vê satisfeito de poder contar as suas histórias e ter gente nova interessada em as ouvir. Contou que, não sendo uma empresa familiar, todas as manhãs, com a esposa a ajudar, a “tocar à forja”, conformava e afiava as ferramentas, antes de ir para o trabalho.

Dia 28 de Junho. Sexta–feira. Quinto dia em Mondim de Basto. Ainda se visitou o museu e contactamos com o Arqueólogo António Pereira Dinis questionando-o sobre os vestígios das atividades relacionadas com o ferro, que determinam toponímias na região como Vilar de Ferreiros, Escourido, entre outras. Extraía-se e fundia-se este metal ou apenas se conformava, forjava? Questões que não tiveram uma resposta certa, pois o seu trabalho de arqueologia não se foca nessa questão. Contudo, não conhece evidências, como as que existem nas grandes minas de minério de ferro em Vila Cova, Vila Real. 

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Na sequência deste continuo desenvolver de relações diretas com a população, foi contactada a Santa Casa da Misericórdia de Mondim de Basto, para poderem aceder, quer aos mais pequenos, quer aos mais vetustos, que esta instituição organiza, em infantário e lar de terceira idade. A recolha de informação, junto destes grupos, teve de estar ligada a atividades mais organizadas. Com as crianças, entre os 3 e os 6 anos, decorreu um conjunto de resultados que foram apropriados para uma Instalação, constituída por 66 blocos de granito amarelo de Mondim de Basto, 21 dos quais pintados a guache, pelas crianças do infantário. O projeto baseado na tradição da pedra e da sua extração, foi apresentado às crianças que intervieram  livremente, em pequenos blocos de granito amarelo, através de cor. Na tentativa de integrar a espontaneidade juvenil a esta matéria, procuraram reconhecer o modo como estas se relacionam com o seu ambiente, com o granito característico desta região e, consequentemente, com a cultura visual de cada um. Partindo dos blocos mecanicamente produzidos, procuraram a reação imediata, revelando uma perspetiva única, aplicada a esta matéria, que apenas poderia ser produzida por estes criativos. As pedras forão expostas, na praça frontal à entrada da Câmara Municipal de Mondim de Basto, numa organização proposta pelo grupo de participantes do 1º. Simpósio de Granito de Mondim de Basto. As pedras pintadas estiveram dispostas para ser levantadas pelas crianças, no final da tarde, de dia 29 de Junho. Esperava-se que, o desejo de as recuperar, mobilizasse os familiares, integrando a comunidade no programa da Bienal do Granito.

COORDENAÇÃO *

 

António Rui Ferro Moutinho
Norberto da Silva Ogórek Jorge 

*Escultores, Professores Doutores, Docentes na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto

e investigadores do Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade [i2ADS - FBAUP].

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